segunda-feira, 18 de abril de 2011

CRÔNICA DE UMA MORTE ANUNCIADA

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Acidentes de trabalho – AFT faz desabafo em artigo
Responsável pelo Projeto de Análises de Acidentes na Superintendência Regional do Trabalho e Emprego na Paraíba – SRTE/PB, a Auditora Fiscal do Trabalho – AFT Ana Mércia Vieira Fernandes convive com situações extremas, em que trabalhadores são vítimas de acidentes de trabalho, em consequência dos quais muitos morrem e outros ficam com sequelas, muitas vezes, por toda a vida.

Em artigo enviado ao SINAIT, ela classifica a quadro de acidentes de trabalho no Brasil como um “terror”, fruto da realidade palpável e, quase sempre, evitável. Ana Mércia recorre ao título de um livro do premiado escritor Gabriel Garcia Marquez – “Crônica de uma morte anunciada” – para dizer que, do jeito que as coisas estão, as mortes são quase que esperadas, tal o descaso de empresários e governos com a vida dos trabalhadores. Mas, como pessoa e como AFT, ela afirma que não se pode esperar pelos óbitos de braços cruzados, é preciso buscar formas de investir em prevenção, de informar os trabalhadores e de preservar a vida.

  “CRÔNICA DE UMA MORTE ANUNCIADA”
ANA MÉRCIA VIEIRA FERNANDES – Auditora Fiscal do Trabalho – Coordenadora do Projeto de Análises de Acidentes da SRTE/PB

Aproveitamos o título do romance do escritor colombiano Gabriel Garcia Marquez, para falar dos constantes acidentes do trabalho na construção civil, que chegaram recentemente ao nosso conhecimento e que vêm sendo anunciados com frequência nos órgãos da imprensa.
E é dos mais altos, belos e suntuosos edifícios que estão sendo construídos e, até mesmo de simples edificações e de tantos outros tipos de obras, que se anuncia que mais um operário caiu, foi eletrocutado ou sequelado por uma máquina. Mais um brasileiro que, saindo de casa para a labuta do dia-a-dia, não voltou ou que vai voltar incapacitado, sofrido pelas dores, pelo tratamento que se estende, para um novo tempo de dedicação e dependências e cuidados de familiares, em especial, no silêncio de suas casas.
Mais um a fazer parte dos inúmeros benefícios pagos pela Previdência Social, quando estão com o contrato de trabalho regularizado ou mais um indigente a depender da caridade das pessoas, se tiver a sorte de recebê-la.
É a força de trabalho que não mais será computada nas estatísticas dos ativos. Foi vítima da dureza do trabalho, que nem sempre engrandece, dignifica; foi vítima de acidente.
Ao analisar os acidentes do trabalho que ocorreram na cidade de Campina Grande, lembrados por serem mais recentes, fiquei a pensar na violência do que analisei, nas causas que levaram a tamanha calamidade.
É o corpo frágil de um homem que voa da 25º laje para ser amparado apenas pela mãe terra. O corpo bate, ao cair, nas plataformas da obra, que, tantas vezes, parecem só enfeitar os prédios. Esse acidente me fez lembrar o trecho da música de Chico Buarque, Construção, que diz: “E tropeçou no céu como se fosse um bêbado. E flutuou no ar como se fosse um pássaro. E se acabou no chão feito um pacote flácido.”
E outro trabalhador que é atingido pela dureza da ferragem sem proteção que espera a próxima vítima e que penetra na sua cabeça como um punhal, traspassando seu crânio.
Impossível não dizer que isso é um terror. Mas o terror vem como algo sem controle e, às vezes abstrato, do medo. Mas essas realidades não. Elas vêm dos riscos existentes nos ambientes e nas condições de trabalho sem controle, vem do ritmo acelerado do desenvolvimento desordenado, vem do descaso com a vida, com a saúde e segurança da força de trabalho. É como uma morte que é anunciada todos os dias.
Estamos próximos de mais um dia em que dedicamos à memória das vítimas de acidentes do trabalho, dia 28 de abril. E é a estes que dedico o meu relato. E é por eles também que devemos seguir em frente, pois o tempo urge e o trabalho na busca de mais prevenção, de ações pelo cumprimento da lei, de informações tão necessárias aos trabalhadores, de lutas por maiores cuidados com a sua saúde, sua integridade física e mental, precisa continuar, pois não podemos esperar, de braços cruzados, as próximas vítimas.
E sejam elas poucas ou muitas, são homens e mulheres e até crianças e adolescentes, que, mais do que nunca, precisam de mais atenção das autoridades, dos serviços públicos, das organizações empresariais, das suas representações e de uma grande mobilização social, para fazer valer o seu clamor e dar voz ao seu silêncio, por melhores condições e ambientes de trabalho, para que não cheguem a viver a dolorosa experiência do infortúnio que é o acidente do trabalho.

http://www.sinait.org.br/arquivos/artigo28249f76b1610f6f3d249f8546ba6999.pdf

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